EUA: Estados proíbem competições infantis de MMA
Marcos Peres
Já há 300 milhões de fãs de MMA ao redor do mundo, segundo a empresa americana de pesquisas de marketing esportivo Repucom. A Rússia estima em 4,5 milhões o número de praticantes de MMA no país. Em duas décadas de existência, o Ultimate Fighting Championship tornou-se uma indústria bilionária. Hoje, americanos da primeira geração de fãs do UFC estão incentivando seus filhos a partir de cinco anos de idade a participar de competições de pankration, uma variação do MMA para crianças, como mostrou o Blog do Marcos Peres no primeiro capítulo da reportagem “Crianças de cinco anos lutam MMA em octógonos nos EUA”.
No primeiro dia de 2014, a Comissão Atlética da Califórnia proibiu as competições de MMA infantil no estado, usando uma brecha legal para alegar falta de segurança para os praticantes, como contou ao Blog o diretor executivo da comissão,
Para a Dra. Diane Levin, professora de Educação Infantil da Universidade Wheelock de Boston, “o que parecia extremo 20 anos atrás parece quase inofensivo hoje. Depois de assistir, elas (as crianças) se comportam de maneira mais violenta em suas brincadeiras e na forma com que tratam os outros. Elas também tendem a simpatizar menos com vítimas de violência”.
Segundo os médicos, algumas das principais preocupações do MMA para crianças estão relacionadas a lesões de pescoço, ossos e ligamentos, além de traumas cerebrais.
Especialista em medicina esportiva para crianças, o médico americano Paul Stricker disse: “Se elas (as crianças) forem contorcidas com muita força ou atiradas com força, poderão se machucar, como em qualquer outra atividade. Apenas temos que ter cuidado com isso. Penso que uma das maiores preocupações seja que mesmo com as regras de não chutar ou socar a cabeça, outras ações como derrubar no chão podem levar a cabeça a bater no solo diversas vezes. Os pais podem se sentir seguros pensando nas regras que protegem a cabeça e o rosto, mas têm que saber que elas não impedem concussões cerebrais ou traumas à cabeça.”
Organizadores do pankration afirmam que as estatísticas de contusões das lutas são melhores do que as do futebol para crianças nos Estados Unidos. Segundo Jon Frank, diretor da United States Fight League – Liga de Luta dos Estados Unidos -, organização que conta hoje com mais de trezentas crianças inscritas desde 2011, houve 39 contusões em competições, em um universo de 844 crianças. Nos últimos dois anos, a USFL alega ter realizado 59 atendimentos médicos (20 adultos e 39 crianças). Onze casos demandaram cuidados posteriores: Uma concussão cerebral moderada e lesões de ombro, joelho, estômago, panturrilha, cotovelo, pé, pescoço e rosto.
Estima-se que cerca de 3,2 milhões de crianças pratiquem MMA na América do Norte. Porém, as competições de pankration ganharam força na costa oeste do país, chamando a atenção das autoridades locais. O Senado do Estado da Califórnia aprovou em outubro de 2013 uma lei, sancionada pelo governador Edmund G. Brown, que deu à Comissão Atlética da Califórnia o poder de “examinar as atividades do pankration infantil no estado.”
Mãe de três meninos praticantes de MMA, de sete, nove e dez anos de idade, no estado da Califórnia, a americana Megan Hook classificou a postura da Comissão Atlética do estado como hipócrita. “Nossa frustração com as autoridades, incluindo a Comissão Atlética da Califórnia e o próprio UFC, é a falta de apoio deles na regulamentação do esporte que vai proporcionar a eles futuros lutadores e, francamente, futura renda”, disse ela em entrevista ao Blog. “Eles estão abandonando essas crianças que assistem e são grandes fãs do esporte. É decepcionante ver os lutadores de UFC, que participam dos mesmos treinamentos e que agora são donos dessas academias de MMA onde treinam as crianças, deixarem de dar apoio ao pankration infantil. Eles são hipócritas”, afirmou Megan.
A um fórum especializado, o presidente do UFC Dana White argumentou que as lutas infantis denigrem a imagem do esporte. “Nojento para c…!”, escreveu White. “Os pais deles deveriam apanhar com uma vara”, completou o executivo.
O diretor da United States Fight League, Jon Frank, disse ao Blog que essas crianças são o futuro do esporte. “Nós continuamos esperando que os líderes da indústria do MMA no mundo nos deem a oportunidade de apresentar o esporte publicamente de forma apropriada. Alguns dos nossos primeiros participantes já estão no UFC”, contou Frank, citando Chris Holdsworth, de 26 anos, campeão da última edição do reality show The Ultimate Fighter nos Estados Unidos e também Cody Bollinger, de 22, dispensado pelo UFC e atualmente lutador do WSOF, World Series of Fighting.
As competições de pankration infantil foram proibidas no estado americano do Missouri. E os torneios proibidos no estado da Califórnia estão migrando para o Arizona, onde acontecem em cassinos de territórios indígenas, locais que não se submetem às leis regulatórias estaduais. O MMA profissional já foi legalizado em 49 dos 50 estados americanos. E a aprovação no estado de Nova York, o último a resistir aos encantos financeiros do MMA por enquanto, parece questão de tempo.
Porém, não deve demorar para que o estado da Califórnia libere novamente as competições infantis, sob novas exigências de segurança. O diretor executivo da Comissão Atlética da Califórnia, Andy Foster, lidera uma subcomissão que vai se reunir pela primeira vez no próximo dia 24 para discutir medidas como a introdução de protetores de cabeça. “A Comissão Atlética da Califórnia não vai regular o pankration infantil. Mas a comissão vai analisar os diferentes órgãos regulatórios que vinham organizando e promovendo essas atividades para ver suas regras e ver se há algumas recomendações que a comissão possa fazer para aumentar a segurança.”
O modelo a ser adotado pelo estado da Califórnia pode determinar parâmetros para que competições de pankration infantil se alastrem pelos Estados Unidos em um futuro próximo. O diretor executivo da Comissão Atlética, Andy Foster acredita que a idade mínima exigida para as competições poderá ser de oito anos. “Nós delegamos autoridade à USA Boxing (federação de boxe dos EUA) e eles estabeleceram a idade inicial de oito anos (para a prática do boxe), com uso de protetor de cabeça. Nós temos conversado com alguns médicos a respeito disso, mas se o boxe amador começa aos oito anos de idade, com protetor de cabeça, estamos considerando essa idade para o pankration. Não estou afirmando que será essa a idade, mas certamente não será menor do que isso.”